Irmãs e irmãos, aprendamos esta triste lição, por isso eu quis lutar sempre pela causa justa de quem já caiu, mas tem gente que não me entende: talvez por eu ser jovem umas pessoas nem vão entender e outras me rechaçam, mas eu decidi lutar e vou manter essa decisão mesmo que me custe a vida.”
(CompArte, Caracol Morelia, 2016)
Foi com alegre rebeldia que no dia 17 de agosto, nós da Coordenação Anarquista Brasileira (CAB) lemos o comunicado lançado pelos povos zapatistas através do Comitê Clandestino Revolucionário Indígena e da Comandância Geral do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN)[1]. A carta informa a decisão de romper o cerco estabelecido ao território zapatista desde os Acordos de San Andrés, de 16 de fevereiro de 1996, e avançar as áreas insurgentes, a partir das décadas de trabalho de base com as comunidades do entorno, que se juntam oficialmente ao território liberado. São 7 novos caracóis e 4 munícipios autônomos tomados de rebeldia [2]! Esse avanço na luta zapatista traz ventos de esperança insurgente para nossas lutas em todo o mundo e precisa ser envolta de solidariedade.
Em seus 25 anos de luta, os povos originários insurgentes que agora conformam o Zapatismo e o EZLN têm sido grande referência na resistência e organização anticapitalista. O avanço de seus caracóis e municípios autônomos é exemplo de que todo processo revolucionário é exercício de libertação gestado lentamente, lado a lado, desde a base, com autonomia e rebeldia.
Nós, anarquistas especifistas, prestamos solidariedade às companheiras e companheiros que firmemente propõem com independência outras formas de organização e luta social. Sabemos que o Estado sempre estará para representar os de cima impondo seus projetos neoliberais, genocidas e anti-povo.
Isso fica elucidado quando há um processo no qual o novo governo mexicano deslegitima e silencia toda forma de dissidência que não concorde com sua lógica desenvolvimentista/progressista/neoliberal, na figura do recém eleito presidente Andrés Manuel López Obrador (do partido MORENA), que diz estar ao lado das classes populares. Na lógica racista e voraz em que o Estado do México se coloca, vemos o avanço da militarização sobre os territórios autônomos zapatistas; o acobertamento e a impunidade dos crimes feitos por paramilitares (forças armadas não oficiais, como as milícias brasileiras); os ataques ao povo do estado de Guerrero; a perseguição, assassinato, encarceramento e sumiço de lutadoras e lutadores sociais que se solidarizaram com a luta dos povos oprimidos; o silenciamento de jornalistas; a falta de respostas pelos 43 estudantes de Ayotzinapa; a continuidade e descaso com os gritantes feminicídios e violências machistas; a “sutil” deslegitimização e criminalização da luta zapatista pelo governo do México; o avanço de megaprojetos, como o trem Maya; e diversos ataques que vem acirrando o cerco aos povos que ousam sublevar-se contra os projetos neoliberais de destruição.
Por isso, nos solidarizamos com as companheiras e companheiros zapatistas e dizemos que sim, sua estrela vermelha arde em vários cantos do mundo! Somos centelhas fumegantes e construiremos solidariedade rebelde e internacionalista entre os povos. Seus cantos, artes, poesias e histórias rebeldes são chamas que pulsam em nossos corações. Dão a dimensão sensível de nossas lutas e nos colocam em constante processo de crítica e autocrítica, no esforço de descolonizar nossas lutas e fortalecer a cura de nossas feridas coloniais, tudo desde baixo e à esquerda.
Que o zapatismo avance e cresça ainda mais, inspirando a luta dos povos oprimidos de todo o mundo, como já tem feito desde o primeiro amanhecer de 1994. Somos muitas e muitos os povos oprimidos que expandem seus ruídos de autonomia e resistência em todos os cantos do mundo e, por isso, companheiras e companheiros, estamos juntas e juntos sem nos vender, sem nos render e sem vacilar!
“Somos rebeldía y resistencia. Somos uno de tantos mazos que romperán los muros, uno de tantos vientos que barrerán la tierra, y una de tantas semillas de las que nacerán otros mundos.”
SEGUIREMOS RESISTINDO DESDE A BASE E À ESQUERDA POR UM MUNDO ONDE CAIBAM MUITOS MUNDOS.
MÃO ESTENDIDA ÀS COMPANHEIRAS E COMPANHEIROS, PUNHO CERRADO AO INIMIGO!
[1] Comunicado do CCRI-CG do EZLN sobre o rompimento do cerco imposto pelo Estado do México
[2] Imagens e vídeos do rompimento do cerco e do estabelecimento de novos caracóis e municípios autônomos:
http://enlacezapatista.ezln.org.mx/2019/08/31/imagenes-de-la-ruptura-del-cerco-i/
Mais informações em: http://enlacezapatista.ezln.org.mx